Qual significado da indumentária Xavante?
A roupa que os indígenas Xavante usam em suas tradições culturais diz mais sobre sua visão de sociedade do que você imagina.
Quando cheguei a faculdade de jornalismo, em 2017, eu já sabia que queria falar de moda. Mas como falar de moda no Mato Grosso, estado que quando o assunto é pautado, muito mais se fala sobre esposas de fazendeiros que viajam à São Paulo consumir em mega shoppings de luxo?! Para não deixar minha fascinação morrer, percebi que tinha que falar para além das marcas, com foco na roupa, na mensagem e cultura.
Recém ingresso na Agência Júnior de Jornalismo Focaia, havia um recorte local e academicista para abordar assuntos, e com eventos culturais rolando no campus da Universidade Federal de Mato Grosso, pensei “essa é a deixa para falar sobre moda de um jeito disruptivo". O tema do evento era sobre a cultura Xavante, e eu bem curioso, me endaguei o que poderia significar cada escolha de peças e acessórios escolhidos em suas cerimônias. Assim, fui perguntando um à um os nomes e os significados e como isso poderia ser entendido por um leigo.
Claro, não dá para aplicar termos eurocêntricos da moda na cultura Xavante. Mas para um bom entendimento, na minha cabeça jovem de 18 anos, pensei que assim seria uma forma de trazer um pouco disso para quem assim como eu tinha essa dúvida. O texto foi bem recebido, meu orgulho de graduação, - apesar do professor fazer eu assumir uma linguagem de Dom Casmurrês, praxe de universidades federais.
Trago aqui à titulo de curiosidade um desses meus primeiros textos mais politizados. Serve também como exercício de leitura e reflexão de onde saí e de onde quero chegar. Espero que gostem. Mas antes... Não deixe de assinar a newsletter e compartilhar com quem possa se interessar!
Acostumada a vida ocidental, a população moderna convive diariamente com suas linguagens e vestuários que reproduzem seus valores e cultura, de modo a se expressar dentro da comunidade, deixando suas marcas. Ainda que existam diferenças no modo de expressão entre grupos sociais, haverá sempre uma proximidade na sociedade urbana, pois ela se relaciona com uma indústria cultural que produz e constrói modelos de comportamento e valores.
No Brasil, no entanto, a multiculturalidade existente torna a sociedade uma paisagem, impedida de observar com atenção o universo de expressão de muitas tribos sociais, entre elas a dos indígenas, que são os povos originários do país. Particularmente os Xavante, na região do Araguaia, trazem significados em suas vestimentas, revelando seus valores e tradições, que ganham um peso histórico e de resistência ao aculturamento, cujos valores vem se fortalecendo ao longo do tempo.
Seus acessórios expressam fielmente cada característica de suas cerimônias e eventos, como é o caso da Danhurédzula, que é uma gravata feita com lãs e penas, semelhante a caracterização social, equivalente a alta costura para eles.
“Sua confecção é feita pelos homens após as mulheres tecerem a estrutura da gravata,” comenta o Cacique José Maria Tse’enhodi, um dos representantes dos Xavante em Barra do Garças, que participaram da III Edição do ICHS InterAtivo, focado na temática indígena, realizado na UFMT, Campus Araguaia, na unidade de Barra do Garças.
Outra peça que se caracteriza como traje de gala é a Imbira ou Weclinhorõ, sendo pulseiras e tornozeleiras de uso obrigatório em celebrações, representando a beleza do povo originário. Os “pauzinhos na orelha”, como se observa em alguns membros da comunidade Xavante, chamados de Wedehu, fazem parte do vestuário masculino e representam maturidade, responsabilidade, ordem e maioridade em sua cultura. O uso é feito em um ritual, em que eles são preparados por um longo tempo, como iniciação à idade adulta.
A maquiagem para as festas é fundamental feita de urucum e wedero (carvão), e se transformam em ícones da cultura indígena, reproduzidos e conhecidos pela maioria das pessoas como marcas de sua identidade e cultura. Seu significado não difere muito da Imbira, cuja pintura quadrada feita na barriga tem como definição o apadrinhamento dos jovens.
O vestuário dos Xavante também mescla peças da cultura do “homem não-indígena” em seus trajes. Eles utilizam em suas celebrações shorts tradicionais de cor vermelha, porém, revelando a manutenção de sua tradição na mescla de culturas, seja no espaço público ou nos seus próprios rituais, nas comunidades.
As particularidades das comunidades indígenas são extensas, na busca de manter seus costumes e culturas, que se revelam nos vestuários, que demonstra complexidade e linguagens pertencentes aos seus ancestrais e comportamento, que resultam em sua identidade e reconhecimento.
Muitas vezes pelo “preconceito” e distanciamento da população de cultura ocidental, os xavante se reinventam dentro de seus hábitos, substituindo o estigma cultural por orgulho em ser quem são, mas não deixando de se atualizar com o mundo, resumiu o Cacique José Maria, durante a palestra do ICHS, em 2017.
1 Notas
Texto escrito para o projeto de extensão Agencia de Jornalismo Júnior Focaia, da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário do Araguaia, em 2017. Escrito por Gabriel Green Fusari sob Orientação do professor Antonio Sebastião da Silva. Fotografias no corpo do texto original por Gabriel Green Fusari.